11 de dezembro de 2015
10 de dezembro de 2015
6 de dezembro de 2015
O MEU NOIVO - conto de Irene Lisboa
Acreditem-me ou não,
tanto faz, mas isto passou-se assim:
Estava eu ao pé da
costureira e pedi-lhe uma agulha. Não, ela é que ma pediu a mim e eu
levantei-me e fui buscar o meu agulheiro. Ofereci-lho, dizendo: olhe que está
aí um cento de agulhas, que tal?
É uma riqueza, foi
como ela me respondeu.
Salta logo dali o meu
irmão: é mentira!
É mentira? —
pergunto-lhe eu indignada.
É mentira e é mentira
e é mentira!
Meu grande malcriado!
Não são agulhas, são
soldados, diz-me ele.
Desatei a rir e
desenrosquei o meu agulheiro. Eu a tirar as agulhas e o João a gritar: ena,
tanto soldado! Não fiz caso do que ele dizia e volto-me para a mulher.
Conta-me uma
história?
Ainda é menina de
história? respondeu-me ela. E eu corei.
Então cante-me uma
cantiga.
Uma cantiga?
Tornei a corar. A
costureira troçava-me, já se sabe. Disfarcei então e pus-me a falar de fatos.
Gostava de ter um muito lindo e muito comprido...
Para ir ao baile?
diz-me ela.
Isso mesmo, para ir
ao baile, respondo-lhe eu. Faz-me um assim?
Porque não hei de
fazer? E riu-se. Eu ri-me também.
Passaram naquele
momento dois rapazes a cavalo e eu fui vê-los à janela, Vai um, atira-me uma
flor que trazia na boca. Apanhei-a no ar. Volto-me para a mulher, envergonhada.
Ela riu-se outra vez.
Estou noiva,
disse-lhe eu.
Parece-me que sim. E
desatamos ambas à gargalhada.
Conhece-os?
perguntei-lhe eu.
Muito bem. Um é
Julião e o outro Jerónimo.
O meu noivo é o
Jerónimo. Casaremos para o ano. A senhora quer fazer o meu enxoval?
Então não havia de
querer? respondeu-me a costureira.
Um enxoval lindo, que
eu tudo mereço!
Pois...
Mal sabia ela!
Isto foi num dia, num
dia... de Abril ou de Maio. Havia já muitas rosas. Depois, quantas vezes tornou
Jerónimo a passar, a pé e a cavalo?
O certo é que nos
vamos casar. Dizem que ainda sou muito nova, mas se eu gosto tanto dele!
Irene Lisboa,
Uma
mão cheia de nada outra de coisa nenhuma.
22 de novembro de 2015
O mundo maravilhoso dos "Contos Tradicionais do Povo Português"
Contos Tradicionais do Povo Português
organização de Teófilo Braga.
Lisboa: Publicações Dom Quixote, 1999.
- 280 p., versão do vol. I disponível aqui.
"A quinta edição dos Contos Tradicionais do Povo Português apresenta-se formalmente tal como o original de 1883, mas em dois volumes.
[...] Nesta obra, Teófilo Braga apresentou ao leitor um conjunto de narrativas que constituem um valiosíssimo acervo de informação, principalmente para as áreas da antropologia e história das mentalidades, sobre as múltiplas manifestações das sociedades tradicionais.
A concepção desta obra reflecte o carácter estruturante da problemática da identidade nacional na dupla vertente romântica e científica. A vertente romântica identifica-se no peso atribuído às versões literárias da tradição popular. O segundo volume reflecte melhor esta intenção, pois T. Braga perspectiva historicamente os reflexos dos contos populares na produção literária e erudita.
Por outro lado, o autor também procura identificar e relacionar os vários grupos em que se divide a novelística portuguesa com a evolução do pensamento religioso. Assim, as fábulas, apólogos e anexins remontariam ao estádio feiticista; os contos e epopeias ao estádio politeísta; e os casos, as novelas e lendas, e os exemplos e parábolas ao estádio monoteísta.
Posto isto, o autor ainda faz uma tentativa de identificação das origens étnicas dos diferentes géneros da novelística.
Estes campos do estudo apresentado por T. Braga, baseado na sua recolha, estão relacionados com a vertente científica, em que a etnogenia tem um lugar de destaque.
[...] No primeiro volume, que constitui a primeira parte da recolha relacionada com os contos de fadas e casos da tradição popular, divide-se em contos míticos da aurora, sol e noite e em lendas e facécias da tradição popular. Quase todos os contos são identificados com o seu local de recolha."
1 de novembro de 2015
O SAPO E A RAPOSA – fábula e atividade
O sapo e a raposa resolveram e
acordaram fazer uma sementeira a meias.
Fizeram a sementeira,
debulharam-na e arranjaram um belo monte de trigo e outro de palha. Depois de
tudo arranjado foram deitar-se nas suas camas. Logo de manhã ergueu-se a raposa
e foi estar com o seu vizinho e compadre sapo e disse-lhe:
— Compadre e
amigo, venho fazer-lhe uma proposta vantajosa.
— Diga lá.
— Vamos ambos ao mesmo tempo até
à eira, e o que lá chegar primeiro fica com o trigo todo.
—
Olhe, minha comadre, fiz umas juras de nunca aceitar propostas sem ouvir
os conselhos de um meu colega. Volte a comadre daqui a uma hora.
A raposa afastou-se e o sapo foi
estar com outro sapo e expôs-lhe a proposta da raposa.
— A coisa arranja-se e a raposa
há de cair, apesar da sua malícia —
respondeu-lhe o colega consultado.
— De que modo?
—
Somos ambos iguais e tão semelhantes que a raposa já não é capaz de nos
diferençar. Eu parto já para a eira e trato de ensacar o trigo. Tu vais estar
com a raposa e, depois de longa discussão, aceitas a proposta. Não dês porém
sinal de partida, enquanto eu não estiver na eira. Quanto à palha, podemos
dar-lha toda; no entanto, vou esconder-lhe dentro um cão para bem a receber
quando ela for tomar posse da palha.
O sapo ficou satisfeito com a
lembrança do colega e foi para sua casa esperar a raposa. Esta não se demorou
muito.
Discutiram ambos por algum tempo
e no final o sapo fingiu que cedia. À hora marcada a raposa dirigiu-se para a
eira de corrida. Quando chegou ali, já o sapo tinha o trigo metido nos sacos.
— Mas como andou o meu compadre
tão depressa? — observou a raposa,
despeitada.
—
Fiz das pernas coração, comadre — respondeu o sapo —, mas como sou muito
seu amigo, cedo-lhe de boa vontade toda a palha, embora esta não entrasse no
contrato.
A raposa, de bico caído, aceitou
a proposta e dirigiu-se para o monte da palha a experimentar se estava
bem moída. Salta de lá o cão e deu-lhe tamanha corrida que a raposa morreu
arrebentada.
Ataíde de Oliveira
(recolha),
in Contos tradicionais portugueses.
Vol. 1, Porto: Figueirinhas, 1975.
ATIVIDADE - A MORAL DA HISTÓRIA
(do manual, p. 24)
Discute com os teus colegas a moralidade (lição moral) da
fábula “O sapo e a raposa”.
Proposta de discussão a partir dos seguintes provérbios (podes acrescentar mais):
Quem ri por último ri
melhor.
Ladrão que rouba a
ladrão tem cem anos de perdão.
Com raposa é bom ser
manhoso.
Sabe muito a raposa,
mas quem a apanha sabe mais.
Mais vale engenho que
força.
Lê aqui
outra versão desta fábula, reescrita por António Torrado e ilustrada por
Cristina Malaquias.
31 de outubro de 2015
AS SEQUÊNCIAS (momentos) DA NARRATIVA «O SAPO E A RAPOSA»
![]() |
Ilustração de Cristina Malaquias |
Enumera os
acontecimentos principais pela ordem em que ocorreram.
[Manual, p. 26].
a. Dois
compadres, um sapo e uma raposa, fizeram uma sementeira a meias. [= introdução,
situação inicial]
b. No dia
seguinte, a raposa propôs ao sapo que fizessem uma corrida até à eira onde
estava o trigo e a palha. O primeiro a chegar ficaria com o trigo todo.
c. O sapo
disse-lhe que lhe daria a resposta depois de consultar um colega.
d. O sapo
consultado disse ao amigo que aceitasse a proposta, pois ele, entretanto, iria
à frente e, quando a raposa chegasse à eira, pensaria que ele era o compadre
dela, dado os dois sapos serem tão parecidos.
e. O sapo
achou boa a ideia e, quando a raposa foi saber a resposta, disse-lhe que
aceitava.
f. À hora
combinada, a raposa correu para a eira, mas, quando lá chegou, viu que o sapo
já ensacara o trigo e fizera um monte com a palha.
g. Fingindo-se
generoso, o sapo disse à raposa que lhe oferecia a palha, onde estava escondido
um cão.
h. Mal a
raposa se aproximou do monte de palha, o cão atacou-a e perseguiu-a. [=
conclusão]
i. A raposa morre
cansada de tanto correr. [moral da história]
26 de outubro de 2015
A Nau Catrineta - romance / rimance compilado por Almeida Garrett
"A Nau Catrineta", filme animado
baseado na banda desenhada de Artur Correia.
Avanca, Filmógrafo, 2012.
Avanca, Filmógrafo, 2012.
Criação gráfica digital e animação: Vítor Lopes
Criação gráfica original: Artur Correia
Narração: Fernando Mendonça
Criação gráfica original: Artur Correia
Narração: Fernando Mendonça
Música: Joaquim Pavão
Voz (música): Isabel Fernandes Pinto
Texto: Romance tradicional
compilado por Almeida Garrett
no Romanceiro.
Texto:
A Nau Catrineta
Lá
vem a Nau Catrineta
Que
tem muito que contar!
Ouvide
agora, senhores,
Uma
história de pasmar.
Passava
mais de ano e dia
Que
iam na volta do mar,
Já
não tinham que comer,
Já
não tinham que manjar.
Deitaram
sola de molho
Para
o outro dia jantar;
Mas
a sola era tão rija,
Que
a não puderam tragar.
Deitaram
sortes à ventura
Qual
se havia de matar;
Logo
foi cair a sorte
No
capitão general.
–
"Sobe, sobe, marujinho,
Àquele
mastro real,
Vê
se vês terras de Espanha,
As
praias de Portugal!"
–
"Não vejo terras de Espanha,
Nem
praias de Portugal;
Vejo
sete espadas nuas
Que
estão para te matar."
–
"Acima, acima, gajeiro,
Acima
ao tope real!
Olha
se enxergas Espanha,
Areias
de Portugal!"
–
"Alvíssaras, capitão,
Meu
capitão general!
Já
vejo terras de Espanha,
Areias
de Portugal!"
Mais
enxergo três meninas,
Debaixo
de um laranjal:
Uma
sentada a coser,
Outra
na roca a fiar,
A
mais formosa de todas
Está
no meio a chorar."
–
"Todas três são minhas filhas,
Oh!
quem mas dera abraçar!
A
mais formosa de todas
Contigo
a hei de casar."
–
"A vossa filha não quero,
Que
vos custou a criar."
–
"Dar-te-ei tanto dinheiro
Que
o não possas contar."
–
"Não quero o vosso dinheiro
Pois
vos custou a ganhar."
–
"Dou-te o meu cavalo branco,
Que
nunca houve outro igual."
–
"Guardai o vosso cavalo,
Que
vos custou a ensinar."
–
"Dar-te-ei a Catrineta,
Para
nela navegar."
–
"Não quero a Nau Catrineta,
Que
a não sei governar."
–
"Que queres tu, meu gajeiro,
Que
alvíssaras te hei de dar?"
–
"Capitão, quero a tua alma,
Para
comigo a levar!"
–
"Renego de ti, demónio,
Que
me estavas a tentar!
A
minha alma é só de Deus;
O
corpo dou eu ao mar."
Tomou-o
um anjo nos braços,
Não
no deixou afogar.
Deu
um estouro o demónio,
Acalmaram
vento e mar;
E
à noite a Nau Catrineta
Estava
em terra a varar.
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